A adesão ao carro elétrico depende de valores acessíveis para compra e manutenção e de infraestrutura de apoio aos proprietários. Com forte participação da iniciativa privada, o país começa a dar respostas nas duas frentes. A maior eletrovia do país tem 730 quilômetros e fica entre Paranaguá, no litoral do Paraná, e Foz do Iguaçu, na fronteira com Paraguai e Argentina. São 11 postos de abastecimento instalados na BR-277. Desde o lançamento, em março de 2018, a rede realizou 330 recargas. De acordo com os dados da Copel, que administra os postos, foram consumidos 2.914 kWh, uma média de 8 kWh por recarga, a um custo aproximado de R$ 6,75 cada. A eletrovia faz parte de um programa de pesquisas da companhia em parceria com Itaipu e governo do Paraná, e por isso, os motoristas não pagam para abastecer.
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Nas estações de recarga rápida o abastecimento de 80% da bateria leva entre meia e uma hora. É o suficiente para o veículo rodar entre 15 0 e 300 quilômetros dependendo do modelo do carro e motor. Na eletrovia paranaense a distância entre as estações é de 80 quilômetros em média. Os eletropostos estão em operação nos trechos de Paranaguá, Curitiba, Palmeira, Irati, Fernandes Pinheiro, Prudentópolis, Candói, Laranjeiras do Sul, Ibema, Cascavel, Matelândia e Foz do Iguaçu. Ao comentar o investimento de R$ 5,5 milhões no projeto o presidente da Copel, Daniel Pimentel Slaviero, ressaltou que a empresa saiu na frente em relação à mobilidade urbana e à descarbonização, “temas que se tornaram uma prioridade mundial”.
Entre as duas maiores cidades do país outra eletrovia começou a operar em julho do ano passado. O corredor elétrico na Rodovia Presidente Dutra liga São Paulo e Rio de Janeiro. A eletrovia é iniciativa do BMW Group Brasil e da EDP, empresa que atua em todos os segmentos do setor elétrico, com apoio da Ipiranga. Seis equipamentos de carregamento rápido foram instalados nos postos da distribuidora de combustíveis ao longo de 430 quilômetros. A distância máxima entre os postos é de 122 quilômetros. O projeto custou R$ 1 milhão e permite o abastecimento simultâneo de até dois veículos. Há eletropostos funcionando em Guararema, São José dos Campos, Guaratinguetá e Queluz, no trecho paulista da Via Dutra, e dois no município de Piraí, Rio de Janeiro. Desde 2014, a BMW já realizou, junto com outros parceiros, a instalação de 100 pontos de recarga no país. A própria EDP, uma das maiores empresas privadas globais do setor elétrico, com operações no Brasil em São Paulo, Espírito Santo e Santa Catarina, pretende ter 100% da frota eletrificada até 2030.
Quanto custa “abastecer” um carro elétrico?
O Brasil já conta com regulação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), específica para o segmento, que prevê a possibilidade de livre negociação de preços de recarga das baterias nos eletropostos. Mas a cobrança ainda não está sendo feita. Segundo dados das empresas concessionárias de energia elétrica, o investimento em carga de eletricidade para um carro elétrico rodar determinado trecho custa um quinto do gasto de um carro com motorização a gasolina no mesmo percurso.
Na América Latina, o Uruguai se destaca por ter inaugurado o primeiro trajeto completo de bombas de abastecimento para carros elétricos. A rota de Maldonado a Colônia tem pontos de recarga a cada 60 quilômetros, aproximadamente. Turistas podem carregar as baterias dos carros elétricos, de graça, com um cartão fornecido pelos postos onde as estações foram instaladas. Para os uruguaios, a cobrança do consumo vem na fatura da conta de luz.
Parcerias e incentivos impulsionam o crescimento
Parcerias entre empresas e o incentivo público impulsionam o crescimento do mercado de carros elétricos e híbridos. Duas tendências fortes neste segmento são a locação e o compartilhamento de veículos. Iniciativas que avançam com a busca por melhorias na mobilidade urbana. Segundo a Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis (ABLA), no Brasil existem em torno de 10 mil veículos híbridos ou elétricos disponíveis para locação. Os modelos Ford Fusion, Toyota Prius, Lexus (CT 200h e LS 550h), BMW (i3 e i8) e Volvo (V60 e XC90 T8) estão entre os mais comuns. Destaque para a cearense VAMO, sigla para Veículos Alternativos para Mobilidade, que foi a primeira locadora de carros a contar com uma frota inteiramente com carros elétricos, em setembro de 2016.
Já em Belo Horizonte está em operação uma iniciativa dos novos tempos envolvendo carros elétricos. A MRV Engenharia, construtora com sede na capital mineira, inaugurou o compartilhamento de veículos elétricos dentro de um condomínio residencial. Uma parceria com a Renault disponibiliza dois veículos Zoe aos moradores. O agendamento para uso é feito pelo aplicativo Renault Mobility. O projeto ajuda a traçar o perfil de utilização dos veículos elétricos pelos brasileiros, como faixa etária do público interessado no uso, principais destinos, horários de utilização, tempo médio por reserva e nível de satisfação. Depois de Minas Gerais, o teste do uso compartilhado do carro elétrico será com moradores de outro empreendimento da MRV, em São Paulo.
“Este modelo de uso compartilhado de veículos já é conhecido em grandes centros mundiais”, explicou o copresidente da MRV, Rafael Menin. A empresa é líder nacional no mercado de imóveis econômicos, com atuação em 22 Estados e no Distrito Federal. A mesma solução passou a ser oferecida dentro da própria Renault, em São José dos Pinhais, no Paraná. Desde o começo de abril a montadora disponibiliza os veículos de frota para uso compartilhado no Renault Mobility. Pelo celular, todo colaborador consegue reservar um carro por 24h. “Agora nosso colaborador pode usufruir da mobilidade compartilhada em seu dia a dia, seja para os dias de semana ou para os finais de semana”, afirma Ricardo Gondo, presidente da Renault do Brasil. A chave fica no interior do veículo e para destravar a porta o usuário também usa o aplicativo.
Outras gigantes também voltaram o olhar para o futuro da mobilidade. A Toyota do Brasil anunciou no final de 2018 o Toyota Mobilty Service, aplicativo semelhante ao da Renault para compartilhamento de veículos entre os colaboradores da Toyota e do Banco Toyota. As iniciativas da montadora incluem ainda soluções para pessoas com mobilidade reduzida e parcerias com startups em grandes centros urbanos.
Desde novembro do ano passado os carros elétricos e híbridos tem taxação menor do Imposto sobre Produtos Industrializados, o IPI. A alíquota que variava entre 7% e 25% caiu para a faixa de 7% a 20%, de acordo com o peso do veículo e a eficiência energética. A redução integra o novo regime automotivo, o Rota 2030 Mobilidade e Logística, lançado pelo governo.Também está em vigor o desconto de mais 2% no IPI para os híbridos com motor a combustão flex, que ser abastecidos com gasolina ou etanol. Vale dizer, que ainda não há carros deste tipo a venda no país. Já a Câmara de Comércio Exterior (Camex), em decisão de 2016, isentou os carros elétricos do imposto de importação, taxa que aumentava em 35% o preço final do carro. Sobre os híbridos ainda incide o imposto de importação e a taxa depende do grau de eficiência energética.
No Paraná, o mercado também comemora o projeto de lei do governo que zera a alíquota de IPVA de veículos elétricos. Hoje o imposto fica em 3,5%. Outra medida anunciada pelo governador Ratinho Júnior é uma proposta de convênio, apresentada ao Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) para que o Estado possa isentar o ICMS para a aquisição desses veículos. Atualmente, os modelos que chegam ao mercado custam em média quase cinco vezes o preço de um modelo popular.
Olhando para o mercado internacional
- No Japão há mais postos de recarga para carros elétricos puros e híbridos plug-in do que postos de combustível.
- Na Noruega, veículos verdes podem trafegar em faixas exclusivas de ônibus. Os proprietários não pagam tarifas em balsas, pedágios urbanos e estacionamento. Eles também ganham toda a estrutura de recarga instalada em casa.
Com o elétrico surgem novas alternativas de compartilhamento
Com os carros ainda com preços proibitivos para grande parte da população, muitos brasileiros acabam tendo o primeiro contato com veículos elétricos com meios mais “lúdicos” de transporte. Bicicletas, scooters e patinetes ganham espaço em estacionamentos e vias de grande circulação das cidades. A tendência vem na contramão dos congestionamentos. Pesquisa realizada pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) para a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), aponta que em média cada brasileiro gasta no trânsito 40 dias por ano.
Poder vencer as filas é uma sensação de prazer única para a curitibana Bruna Cosmoski. A dentista adotou um MUV (veículo de mobilidade urbana) no começo do ano passado como alternativa ao uso do carro e do transporte coletivo para percorrer aproximadamente 2 Km, entre a casa dela e o consultório. “Escolhi porque não posso chegar suada no meu trabalho e prefiro me maquiar em casa. É barato, confortável e divertido, além de não poluir o meio ambiente”, explica. O veículo atinge até 40 Km/h e o condutor não precisa ter carteira de habilitação. Questão que já começou a ser discutida. Com a popularização do uso desses MUVs há uma cobrança para a regulamentação desses veículos no trânsito urbano.
Esse mercado “alternativo”, compartilhado ou não, está em crescimento e gera novas oportunidades de negócios. A montadora de veículos MXF Motors do Brasil, com sede em Curitiba, importa os kits da China, monta e vende os veículos aqui. São dois modelos, que pesam entre 40Kg e 50Kg. A bateria dura até duas horas para uso ininterrupto. Fabricados em aço carbono dobrável, podem ser guardados dentro de casa e transportados em veículos em deslocamentos longos. Em média, as vendas crescem 30% ao ano.
Também para uso pessoal, ou voltados para o compartilhamento por meio de locação, as scooters, bicicletas e patinetes elétricas caíram no gosto do morador de grandes cidades. O deslocamento em duas rodas tem mercado promissor entre consumidores que optam pela não propriedade do veículo. E o uso dos elétricos virou febre. Vitória, no Espírito Santo, foi uma das primeiras capitais a regulamentar o tráfego de patinetes elétricas. Desde o começo de abril, os patinetes só podem ser usados por jovens com mais de 16 anos, nas calçadas e com velocidade de até 6 km/h. Já o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) estabelece que nas ciclovias e ciclofaixas, a velocidade máxima pode chegar a 20 km/h. O uso de capacete é obrigatório para quem trafega em bicicletas elétricas e recomendado para os usuários de patinetes.
Em São Paulo, a Carbono Zero Courier ganhou visibilidade por usar só veículos elétricos no serviço de entregas expressas. Bicicletas, scooters e furgões elétricos, mais um exército de 245 profissionais, fazem da startup uma aliada para aliviar o trânsito, os estacionamentos, o barulho e a poluição das cidades. Desde 2010, quando foi criada, a startup já evitou que 330 toneladas de CO² fossem despejadas na atmosfera da capital paulista, Barueri e Santos.
Nesse mesmo modelo, a SemCO2 faz entregas em Curitiba usando só meios de transporte ecologicamente corretos, como bicicletas, bicicletas elétricas, skate, veículos elétricos e até maratonistas. Já o James Delivery, aplicativo de compra e entrega de mercadorias, tem metade da frota formada por bicicletas, e também opera na capital paranaense.
Uma pesquisa inédita realizada no começo do ano pela MOB INC, consultoria de pesquisa especializada na análise e seleção de consumidores, levantou como pode ser o relacionamento dos consumidores com os carros no futuro. Foram ouvidos os early adopters, pessoas que se relacionam com os produtos de forma mais engajada e criativa, influenciam a cadeia de consumo e ditam tendências. Entre os fatores de escolha de carros foram citados conforto e design inteligente. E mais da metade são receptivos ao compartilhamento de carona, aluguel de carros e transporte privado por meio de aplicativos. A ampla maioria se mostrou preocupada com o desenvolvimento de veículos que possam prejudicar o meio ambiente e a qualidade do ar que se respira nas grandes cidades. Os veículos elétricos são vistos como alternativa porque não emitem gases poluentes.
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